A força de Udes Cruz


Jornalista

A gratidão não é apenas a maior de todas as virtudes, ela é a mãe de todas as outras, conforme concepção do político, escritor, orador e filósofo romano Marcus Tulius Cícero, (106 – 43 a.C.). Sou adepto dessa tese, gosto de externar tal sentimento àqueles que me dispensaram e me dispensam auxílio nas horas necessárias.
Por conta disso, decidi escrever, em forma de agradecimento, sobre as pessoas que me apoiaram na carreira de jornalista. Tudo começou com Udes Cruz, um dos mais talentosos, competentes e brilhantes comunicadores do Maranhão. Chegou a assumir cargos de destaque, como chefe da Assessoria de Comunicação da Câmara Municipal de São Luís, Secretário de Comunicação da Prefeitura e também do governo do Estado.
Ele me abriu as portas do mundo mágico do jornalismo como fruto de mera casualidade. Eram aproximadamente 13h do dia 14 de junho de 1979, quando fui procurá-lo na redação do O Jornal, que ficava localizado na Rua Cândido Ribeiro, para pedir-lhe um favor. Ele era destacado repórter e imediatamente me diz que o matutino estava precisando de um revisor de texto, indagando se eu topava assumir a função, para começar naquela mesma tarde.
À época, eu trabalhava como colocador de acessórios na Casa Califórnia, no Canto da Fabril, para onde fui levado por Luziberto Souto (Pinto), depois que deixei o Exército, no final de 1977. Nunca mais voltei lá. Udes me apresentou a Mauro Bezerra, que formava o grupo dirigente do jornal, juntamente com Djard Ramos Martins, Ruy Ilayno Coelho de Abreu e Raimundo Nonato Cordeiro Filho.
Almocei na cantina, fui conhecer a redação, a gráfica e depois o local de trabalho. Era pura magia para mim. Estava extasiado com o movimento dos repórteres em suas máquinas datilográficas, o barulho intermitente do aparelho de telex, na recepção de matérias das agências de notícias. Um mundo novo se abria. O Jornal tinha uma seleção de célebres jornalistas: Benedito Buzar, Jersan Araújo, Othelino Filho, Aldir Dantas, Samuel Filho, Batista do Lago, José Salim, que era o editor, Eloy Cutrim, Douglas Cunha, Adenis Matias e Ribamar Cardoso, dentre outros, além de vários colaboradores, entre os quais se destacava o poeta ecritor Carlos Cunha
Minha função era ler todas as matérias e fazer correções gramaticais. Ainda estávamos a anos-luz das comodidades e rapidez que a internet nos propicia atualmente. Jornais eram de feitura quase que artesanal, mas de forma tecnológica avançada para a época. Eram vários processos até a fase final, a impressão. Às vezes, uma pane ou falta de energia elétrica fazia com que a impressão só viesse a ser encerrada pela manhã.
Estava morto de feliz naquele primeiro dia. Comecei no período da tarde e semanas depois, o outro revisor, Fernando Campelo, filho do lendário radialista Murilo Campelo, da Rádio Difusora, pediu que trocasse de horário com ele, porque precisava estudar para um concurso da Polícia Federal, de onde hoje ele é aposentado.
Trabalhava até a madrugada, sempre curioso em aprender todo o funcionamento daquela engrenagem, tanto na parte jornalística como gráfica. Aprendi a operar máquina de fotomecânica, montagem de páginas e outras operações. Tinha bastante tempo à noite.
Meu passaporte para a redação foi por conta de um impulso, em decorrência de uma tragédia. No início de agosto, estava na redação, por volta das 22h, esperando a composição de matérias para revisão, quando atendo a um telefonema. Era do Instituto Médico Legal (IML), com o plantonista afirmando que havia acontecido um acidente em frente à Universidade Federal do Maranhão (UFMA), com resultado de duas mortes.
O forte do O Jornal era matéria policial. Vi que a manchete que estava pronta para o dia seguinte era assunto sem muito impacto. Chamei o motorista e pedi que ele fosse comigo no Bairro de Fátima. De lá rumamos para o local do acidente. As vítimas era o diretor do Colégio Santos, que funcionava no Anjo da Guarda e sua secretária.
Fiz o texto. Mudei a manchete. Quando, no dia seguinte chegou ao local de trabalho, alguém me diz que estavam querendo minha presença numa reunião na redação. Fiquei preocupado. Sem sentido a preocupação, pois na realidade queriam me parabenizar pela iniciativa. Estavam a me esperar o editor, José Salim, Aldir Dantas, Udes Cruz e o próprio Cordeiro Filho, que dirigia a redação e a gráfica do matutino. O Aldir sugeriu que fosse deslocado direto para a redação. Mas não havia substituto para a noite. Decidi da minha forma. Aos domingos, eu faria a ronda policial. Daí iniciei a carreira.
O ano de 1979 foi de muita agitação política e social pelo Brasil afora.

João Castelo foi escolhido, no ano anterior, governador, pelo presidente Ernesto Geisel cuja opção evitou um confronto entre as facções arenistas de José Sarney e Nunes Freire. Assumiu em 15 de março de 1979. Sua indicação, atendeu a um pedido de seu primo, o brigadeiro Paulo Sobral Ribeiro Gonçalves.
Quem me fez tal revelação foi o engenheiro João Rodolfo Ribeiro Gonçalves, que foi secretário de Obras e Transportes durante a administração castelista, realizando a execução de uma série de obras estruturantes em todo o Estado. Rodolfo ressalta que o próprio Sarney queria voltar ao governo, mas enfrentava a rejeição do então governador Nunes Freire e de outras correntes arenistas.
Em 1979, o Brasil registrou inflação de 77,21%, a mais alta desde o início da ditadura militar. O então presidente João Baptista Figueiredo e sua equipe econômica buscavam soluções para o problema que cada vez mais afetava o poder de compra da população e gerava instabilidade na economia.
O ano foi marcado também por uma importante mudança política, com a promulgação da Lei da Anistia, que permitiu o retorno de exilados políticos e a retomada de atividades políticas de muitos opositores ao regime militar. Isso marcou o início do processo de redemocratização do país.

São Luís vira palco de um dos maiores movimentos populares de sua história, a lendária Greve da Meia Passagem, visando a adoção da meia passagem para estudantes. A greve foi marcada por forte repressão policial às passeatas e assembleias. Desenvolvida entre 14 a 22 de setembro, marcou São Luís pelo grande número de adesões e pela brutalidade policial empreendida.
Foi iniciada após o terceiro aumento das passagens de ônibus no mesmo ano pelo prefeito Mauro Fecury. Estudantes da Universidade Federal do Maranhão declararam greve e foram reprimidos ao sair em passeata para o centro da cidade ao entrarem na Rua de São Pantaleão.
Apesar da repressão e da vigilância presentes na época conseguiram angariar apoio dos outros estudantes da cidade e dos mais variados segmenros fa sociedade ludovicense.
Os dias 17 e 18 de Setembro concentraram a maior parte da violência. O ato público na Praça Deodoro reuniu 15 mil pessoas no dia 17 e foi brutalmente reprimido por forças policiais. O dia 18 amanheceu com o comércio fechado, transporte público parado e mais enfrentamento entre a polícia e manifestantes.
O Governador do Estado, João Castelo, decidiu negociar e determinou a libertação de alguns presos e concede parte do estádio Nhozinho Santos para uma assembleia dos grevistas. Eles decidem diminuir os enfrentamentos devido a postura de negociação do governo, mas continuam a greve até o dia 22. No dia 28 foi sancionada a leia da meia passagem e no dia 1º de Outubro entrou em vigor.
A greve foi de grande significado para a política do Maranhão e João Castelo foi muito criticado pela brutalidade da repressão policial aos manifestantes. Mesmo na eleição municipal de 2008, 29 anos depois, Castelo foi teve que responder politicamente pelo repressão. Vale registrar, aqui, que a meia passagem para estudantes foi fruto de uma lei de autoria do vereador Carlos Alberto Pinto, em 1958. Sancionada, jamais havia sido colocada em vigor.
Nesse ano, o Brasil registrou inflação de 77,21%, a mais alta desde o início da ditadura militar. O então presidente João Baptista Figueiredo e sua equipe econômica buscavam soluções para o problema que cada vez mais afetava o poder de compra da população e gerava instabilidade na economia.
O ano foi marcado também por uma importante mudança política, com a promulgação da Lei da Anistia, que permitiu o retorno de exilados políticos e a retomada de atividades políticas de muitos opositores ao regime militar. Isso marcou o início do processo de redemocratização do país.
Atento a tudo, trabalhava de domingo a domingo. Me sentia orgulhoso, principalmente quando o Fusca ostentando a logomarca do O Jornal me apanhava nas manhãs de domingo no Anjo da Guarda. Virei celebridade no bairro. Estava iniciando uma carreira de muitos percalços, mas de ações qiie considero de vitórias.
Udes Cruz foi um exemplo de profissional. Começou como repórter no Diário da Manhã, com Amorim Parga, depois se transferiu para O Jornal , foi redator político do Jornal de Hoje e, em 1994, fundou, em formato fe revista, o ATOS E FATOS. Em dezembro de 1997, me convidou para que transformássemos esse semanário em jornal diário. Aceitei o desafio e, às 3 horas da manhã do dia 18 daquele mês, estava nas bancas o primeoro número do mais novo matutino de São Luís.
Foi um profissional que deixou enorme lacuna no jornalismo do Estado, ao falecer, no dia 4 de fevereiro de 2012. Legou uma história de vida, ao lado de sua esposa, a pedagoga Maria do Rosário Azevedo da Cruz, uma mulher extraordinária, minha amiga, como se fosse minha irmã. Deixou registrada uma bela página na comunicação e os filhos Udes Filho, jornalista, Jusse Cruz, jornalista e professora universitária na Itália, Maira, serventuária do Tribunal de Justiça do Maranhão e Saíle, advogada e professora universitária e, também Hilário Marques, empresário.
Ainda percorro os caminhos da Comunicação, graças à força do Udes Cruz.

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