Rodrigo Rangel
da Revista Veja
da Revista Veja
O engenheiro Paulo Roberto Costa já foi um dos homens da República. Indicado pelo mensaleiro José Janene (FF), ele ocupou a diretoria de Abastecimento e refluo da Petrobras entre 2004 e 2012. Nesse período, passaram por seu gabinete decisões sobre aluguel de plataformas e navios, manutenção de gasodutos e construção de refinarias — e, junto com elas, interesses bilionários que despertavam a atenção empreiteiras. Paulinho, como era chamado pelo ex-presidente Lula, soube servir a tantos e tão variados senhores que, como de costume, logo passou a ser cortejado por eles. No Congresso, PT, PMDB e PP disputavam sua paternidade, tratavam-no como um afilhado dileto e elogiavam sua eficiência. Paulo Roberto era um exemplo a ser seguido, segundo seus padrinhos políticos. Foi assim até março deste ano, quando a Polícia Federal prendeu o ex-diretor sob a acusação de participar de um megaesquema de lavagem de dinheiro comandado pelo doleiro Alberto Youssef. Antes festejado, Paulo Roberto passou a assombrar os partidos, transformando-se num fantasma capaz de implodir candidaturas de relevo e jogar o governo no centro de um escândalo de corrupção de proporções semelhantes às do mcnsalão. E isso aconteceu.
As investigações já haviam revelado a existência de uma ampla rede de corrupção na Petrobras envolvendo funcionários da empresa, grandes empreiteiras, doleiros e políticos importantes. Funcionava assim: para terem acesso aos milionários contratos da estatal, as empreiteiras eram instadas a reverter parte de seus lucros aos cofres da organização. O dinheiro, depois de devidamente lavado por doleiros, era distribuído entre os políticos e os partidos da chamada base de sustentação do governo. Apesar das sólidas evidências que surgiram, faltava o elo mais importante da cadeia: a lista dos beneficiados, os corruptos, o nome de quem recebia ou se locupletava de alguma forma do esquema de arrecadação de propina. Não falta mais. Por medo de ser apontado como o único e principal responsável pelo esquema de corrupção que superfaturou e desviou recursos de projetos da Petrobras, Paulo Roberto topou negociar os termos de um acordo de delação premiada, instrumento legal pelo qual acusados têm direito à redução de pena ou até mesmo ao perdão judicial se colaborarem com as investigações, e identificou aqueles que seriam seus mais influentes parceiros.
Uma série de depoimentos do ex-diretor à Policia Federal explica essa reviravolta e ajuda a esclarecer por que Paulo Roberto era tão admirado quando despachava na Petrobras e, agora, já atrás grades, é tão temido na Praça dos Três Poderes. Colhidos desde o dia 29 de agosto, eles renderam mais deram aos delegados e procuradores um cardápio de políticos que, segundo o ex-diretor, se refestelaram nos poços bilionários da Petrobras. Aos investigadores, ele disse que três governadores, seis senadores, um ministro de Estado e pelo menos 25 deputados federais embolsaram ou tiraram proveito de parte do dinheiro roubado dos cofres da estatal. A alta octanagem das declarações provocou, de imediato, uma mudança na estratégia de investigação. Por envolver políticos detentores de foro privilegiado, que só podem ser processados nos tribunais superiores, o assunto passou a ser acompanhado pelo gabinete do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e pelo Supremo Tribunal Federal.
Nos últimos dias, VEJA obteve detalhes de uma parte significativa das declarações prestadas pelo ex-diretor. Paulo Roberto acusa uma verdadeira constelação de participar do esquema de corrupção. É o caso dos presidentes da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), além do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão (PMDB-MA). Entre os senadores estão Ciro Nogueira (PI), presidente nacional do PP, e Romero Jucá (PMDB-RR), o eterno líder de qualquer governo. Já no grupo de deputados figuram o petista Cândido Vaccarezza (SP) e João Pizzolatti (SC), um dos mais ativos integrantes da bancada do PP na Casa. O ex-ministro das Cidades e ex-deputado Mário Negromonte, também do PP, é outro citado por Paulo Roberto como destinatário da propina. Da lista de três governadores citados pelo ex-diretor, todos são de estados onde a Petrobras tem grandes projetos em curso: Sérgio Cabral (PMDB), ex-governador do Rio, Roseana Sarney (PMDB), atual governadora do Maranhão, e Eduardo Campos (PSB), ex-governador de Pernambuco e ex-candidato à Presidência da República, morto no mês passado em um acidente aéreo.
Pelo acordo, Paulo Roberto se comprometeu a detalhar o envolvimento de cada um dos políticos no esquema. Até por isso, estima-se que, para esgotar o que ele tem a dizer, pelo menos mais três semanas de depoimentos serão necessárias. Sobre o PT, ele afirmou que o operador encarregado de fazer a ponte com o esquema era o tesoureiro nacional do partido, João Vaccari Neto, cujo nome já havia aparecido nas investigações como personagem de negócios suspeitos do doleiro Alberto Youssef. Ao elaborar a lista de políticos e partidos envolvidos e empreiteiras que participavam do esquema (veja reportagem) e descrever a maneira como a propina era transposta de um lado para outro por vias clandestinas, Paulo Roberto Costa vem ajudando os investigadores a montar um quebra-cabeça cuja imagem, ao final, lembrará em muito outro grande escândalo recente da política: o esquema funcionou a pleno vapor nos últimos três governos do PT e tinha como objetivo manter intacta e fiel a base de sustentação no Congresso Nacional.
Ao irrigar o caixa das siglas aliadas e o bolso de seus integrantes, a engrenagem ajudava a manter firme as alianças. Qualquer semelhança com o mensalão, portanto, não é mera coincidência — com a diferença de que, agora, as cifras giram na casa dos bilhões. Nas declarações que forneceu à polícia, Paulo Roberto não mede esforços para mostrar quanto era poderoso na estrutura criminosa. Já nas primeiras oitivas, ele fez questão de dizer que, na época em que era diretor da Petrobras, conversava frequentemente com o então presidente Lula — e costumava tratar com ele de assuntos da companhia. "Por várias vezes, tratei diretamente com o presidente Lula", declarou, numa das primeiras conversas com os investigadores. Da caixa de segredos de Paulo Roberto ainda há muito mais a sair. Ele se comprometeu a detalhar o conteúdo das conversas com o ex-presidente.
Os depoimentos têm sido colhidos por temas — e um deles, já programado, servirá para esclarecer um assunto que virou emblema da barafunda em que a Petrobras foi metida: a controversa compra da refinaria de Pasadena, no sabe, gastou 1,2 bilhão de dólares num complexo que, pouco antes, havia sido arrematado por 42,5 milhões. Junto com Nestor Cerveró, seu colega de diretoria, Paulo Roberto foi um dos responsáveis por costurar o negócio. Em conversas preliminares, o agora delator admitiu aquilo de que já se desconfiava: segundo ele, a operação de aquisição de Pasadena também serviu para abastecer o caixa de partidos e para pagar propina a alguns dos envolvidos na transação. Nos próximos dias, Paulo Roberto prestará um depoimento específico sobre o assunto, em que deverá contar como o negócio foi engendrado e como o dinheiro pago a mais pela Petrobras foi parar em mãos erradas. O delegado encarregado do inquérito sobre Pasadena, que corre em Brasília, irá a Curitiba especialmente para ouvir o ex-diretor. Até meados da semana passada, ele não havia feito nenhuma acusação formal contra a presidente e candidata à reeleição Dilma Rousseff, mas, sempre que havia alguma menção a ela, demonstrava mágoa profunda, e lembrava que na base das operações estão os políticos que apóiam o governo.
Aos mais próximos, por mais de uma vez ele se queixou da postura da petista. O argumento sempre foi o mesmo: ela ataca publicamente ex-diretores da Petrobras sem considerar que, politicamente, era beneficiária das uma vez que o dinheiro sujo proveniente de lá ajudava a bancar a base de sustentação do governo no Congresso. Por que o ex-diretor resolveu contar o que sabe? A pessoas próximas ele confidenciou que não gostaria de repetir a história de Marcos Valério, o operador do mensalão, condenado a quarenta anos de cadeia enquanto os cabeças do esquema já estão à beira de deixar a prisão. A saída, então, foi partir para a delação premiada. O primeiro depoimento foi prestado na sexta-feira 29 de agosto. Desde então, as sessões para ouvi-lo têm sido diárias.
No prédio da Polícia Federal em Curitiba, Paulo Roberto Costa vem sendo interrogado por delegados e procuradores. Os depoimentos são registrados em vídeo — na metade da semana passada, já havia pelo menos 42 horas de gravação. Ao final de cada sessão, todo o material é lacrado. Os arquivos são criptografados para evitar vazamentos. Tamanho cuidado não é por acaso: as revelações que emergem dos depoimentos de Paulo Roberto são explosivas e tem potencial para causar um terremoto político em Brasília. Já nos primeiros depoimentos, ele esmiuçou a lógica que predominava na assinatura dos contratos bilionários da Petrobras. Admitiu, pela primeira vez, que as empreiteiras contratadas pela companhia tinham, obrigatoriamente, de contribuir para um caixa paralelo cujo destino final eram partidos e políticos de diferentes legendas da base aliada do governo. Em outras palavras, Paulo Roberto confirmou a existência de um megaesquema de cobrança de propina que funcionava no coração da maior companhia da América Latina — e confessou que a sua poderosa diretoria estava a serviço da engrenagem criminosa.
O esquema se estendia, segundo ele, a outras diretorias da Petrobras, e cada partido tinha seus encarregados de fazer a interligação entre os negócios e a política. O ex-diretor citou o PP, o PMDB e o PT como os principais beneficiários do propinoduto. Pouco antes de topar a delação premiada, Paulo Roberto fez chegar a seus velhos conhecidos uma declaração assustadora, especialmente para aqueles cujos nomes estarão nas urnas nas eleições de outubro. "Se eu falar, não vai ter eleição", disse. Perguntado pelos investigadores sobre o que queria dizer com a declaração, fez um pequeno reparo: "Pode até ter eleição, mas o estrago será grande". E começou a contar o que sabia.
Contadora é ameaçada
As máfias são sociedades secretas que crescem à sombra do Estado, nutrem-se do crime, espalham tentáculos pelas instituições oficiais e se protegem empregando a violência. À medida que avançam as investigações da Policia Federal sobre os negócios criminosos do doleiro Alberto Youssef, tornam-se mais evidentes os sinais de que uma organização ilegal se instalou no coração da maior estatal brasileira, a Petrobras. Um esquema que envolve políticos, partidos e algumas das maiores empresas do país. Há dois meses, a contadora Meire Poza colocou-se na linha de fogo entre os criminosos e a polícia. Ela, que comandou a engenharia financeira da quadrilha por quase quatro anos, que sabe quem pagou, quem recebeu, quem é corrupto, quem é corruptor, decidiu mudar de lado e colaborar com as investigações. A máfia, porém, não costuma perdoar traição.
Há duas semanas, Meire entregou à Polícia Federal uma gravação que pode criar sérios problemas a quatro grandes empreiteiras do pais. Nela, um homem identificado como Edson tenta convencer a contadora a aceitar os serviços de um escritório de advocacia contratado pelas empreiteiras envolvidas no escândalo de desvio de dinheiro de obras da Petrobras. O encontro aconteceu na noite de 22 de julho deste ano, em um shopping de São Paulo. A gravação não deixa dúvidas sobre as más intenções do grupo, claramente incomodado com o avanço das investigações da policia, e muito preocupado com a colaboração de Meire. A intenção é intimidá-la.
Edson, um suposto advogado, se diz representante das empreiteiras Camargo Corrêa, OAS, UTC e Constran.
A conversa, gravada pela contadora, começa descontraída, amigável, e vai evoluindo para a ameaça. Prestativo, ele se põe à disposição para ajudar, dar apoio jurídico, mas a oferta é recusada. Em tom de voz linear, o emissário passa a revelar os verdadeiros propósitos do encontro.
“Sabemos que tem uma filha, que são somente vocês duas”, diz. No mesmo tom linear, lembra que Meire pertence a um “grupo fechado” e que, como pessoa de confiança de Alberto Youssef, não pode desse grupo ou recusar a ajuda de seus clientes. E vai ao ponto central do problema: “Dona Meire, o importante é não falar demais! De repente, uma palavra mal colocada pode ser perigoso, pode ser prejudicial”.
Meire tenta se esquivar das ameaças, diz que está começando a não gostar do rumo da conversa, mas o advogado é ainda mais direto: “A senhora pode, sem querer, ir contra grandes empresas, políticos, construtoras. As maiores do país, a senhora entendeu?". Percebendo um sinal de nervosismo na contadora, ele avança, pergunta se Meire acha que ainda tem alguma coisa a acrescentar para a polícia e que tipo de acordo ela pretende fazer. Ela diz que não sabe como procederá. E o advogado vai direto ao ponto mais uma vez: "A gente não pode deixar que a senhora não aceite essa ajuda". Diante da pressão, Meire finalmente reage. Afirma que se sente ameaçada, que não quer ajuda das empreiteiras e e encerra a conversa com um recado: "O senhor provavelmente vai estar lá com os seus clientes, com a Camargo (Corrêa), com a UTC, com a Constran, com a OAS... Manda todo mundo ir tomar...".
A polícia ainda tenta descobrir a verdadeira identidade de Edson. Meire Poza contou que conheceu o porta-voz das ameaças no escritório do advocado erários Alberto da Crosta Silva, segundo ela o responsável por coordenar uma equipe de advogados contratados pelas empreiteiras. Procurado, tratar da Operação Lava-Jato. "Essa moça me procurou para pedir ajuda. Ia prestar depoimento à polícia e queria aconselhamento jurídico. A única coisa que fiz foi indicar um colega para acompanhá-la." Costa Silva foi preso na Operação Anaconda, em 2003, acusado de participar de um esquema de venda de sentenças judiciais em São Paulo. E o tal Edson? “Não conheço, nunca ouvi falar”. A memória, ao que parece, não é o ponto chave do advogado.
Meire Poza contou que foi apresentada a Costa Silva depois de procurar as empreiteiras para cobrar uma dívida de 500.000 reais que elas tinham com Alberto Youssef antes da prisão do doleiro. As empreiteiras prometeram saldá-la, mas queriam que a contadora se comprometesse a manter silêncio sobre as e relações com o grupo – e indicaram Costa Silva para cuidar do acordo. "Adoraria atuar por esses grandes clientes, mas infelizmente não atuo." Em nota encaminhada a VEJA, a UTC, que também controla a Constran, confirmou que o escritório de Costa Silva, ao contrário do que ele disse, presta, sim, serviços jurídicos ao grupo. Se houve a ameaça, a empresa desconhece e garante que nada teve a ver com isso. A Camargo Corrêa negou qualquer envolvimento com o advogado ou com a contadora. A OAS não se manifestou.
O cerco não se restringiu à ameaça. Meire tomou a decisão de entregar a gravação à policia depois de descobrir que um de seus e-mails fora invadido meses atrás. “Quem acessou meus dados pessoais tomou o cuidado de modificar o número de celular da conta. Acho que fizeram isso para que eu soubesse da invasão. Foi um recado de que eles têm meus dados pessoais e sabem onde eu moro. Fiquei muito assustada", disse a contadora. Desde que virou testemunha da Policia Federal nas investigações sobre a quadrilha de Youssef, Meire Poza tornou-se um perigo real para os envolvidos, principalmente os corruptores. Ciente disso, ela avisa que já buscou proteção policial.
Segundo Costa, o PT e seus aliados montaram uma espécie de mensalão 2.0 na Petrobras. O dinheiro desviado, segundo ele, irrigava as contas de governadores, 12 senadores, do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e o da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN) e pelo menos mais 50 deputados integrantes do PMDB, PP e PT, partidos da base de apoio à presi¬denta Dilma Rousseff no Congresso. Também foi citado por Costa o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Participaram do esquema os os senadores Fernando Collor (PRB-AL), José Sarney (PMDB-AP) e a governadora do Maranhão, Roseana Sarney. O deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), um dos pontas de lança do movimento "Volta,Lula" no Congresso. Também teria dsido mencionado pelo ex-diretor da Petrobras. "Todo dia tinha político batendo na minha porta , afirmou Paulo Roberto Costa na delação premiada, com a intenção de dar a dimensão do estreito relacionamento com empreiteiras e parlamentares de diversas matizes. Os políticos receberiam, segundo Costa, 3% do valor dos contratos da Petrobras exatamente no período em que ele comandava o setor de distribuição da estatal, entre 2004 e 2012. Ainda em seu depoimento, Paulo Roberto Costa reconheceu pela primeira vez que as empreiteiras contratadas pela Petrobras eram obrigadas a fazer doações para um caixa paralelo que abasteceria partidos e políticos que apóiam Dilma. Haveria, de acordo com ele, um "cartel de empreiteiras" em todas as áreas da estatal. O ex-diretor da Petrobras ainda mencionou uma conta de um operador do PMDB em um banco europeu. Por causa da citação aos políticos, que detém foro privilegiado, os depoimentos serão enviados à Procuradoria Geral da República. Mas os procuradores afirmam que só irão receber a papelada ao término da delação. A expectativa é de que novos nomes de políticos possam aparecer.
A rede de corrupção na Petrobras era ampla. Os desvios envolveriam desde o funcionário do terceiro escalão até pesos pesados da cúpula da empresa, durante a gestão de Paulo Roberto Costa na diretoria de Abastecimento. Não se sabe ainda o montante do desvio, mas só na construção da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, que custou RS 40 bilhões e foi a obra mais cara da Petrobras tocada por Costa, o esquema criminoso movimentou pelo menos R$ 1 bilhão, o que já faz deste o maior escândalo da República recente. Segundo a Polícia Federal, os contratos eram superfaturados e o sobrepreço era repassado pelas empreiteiras ao doleiro Alberto Youssef. Ao doleiro, ainda de acordo com a PF, cabia distribuição de suborno aos políticos.
Potencialmente devastador, o conteúdo dos depoimentos pode até alterar novamente o rumo das eleições presidenciais. Com viagem marcada para o Rio de Janeiro na sexta-feira 5, o ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom), Thomas Traumann, teve de permanecer em Brasília, a pedido da presidenta Dilma, para pilotar o desenrolar da crise. Dilma se preparava para um comício eleitoral em Porto Alegre. Diante do novo quadro, voou às pressas para Brasília. Também participou do encontro no Alvorada o ministro da Justiça, José Eduardo Cardoso. Na reunião, ficou acertado que o Planalto entraria em contato com integrantes da base de sustentação de Dilma para que afinasse o discurso que seria adotado no fim de semana para rebater as acusações. Dentro dessa estratégia o vice-presidente da República, Michel Temer reuniu-se com lideranças do PMDB de diversos estados, em São Paulo, na noite de sexta-feira 5. O temor do governo é o potencial do abalo na campanha eleitoral de Dilma faltando eleições. Os beneficiários diretos seriam, obviamente, a candidata do PSB, Marina Silva, e o do PSDB, Aécio Neves. A preocupação do Planalto é de que a eleição seja liquidada no primeiro turno da disputa presidencial.
Segundo a PF, os depoimentos de Paulo Roberto Costa foram longos. No primeiro dia, sexta-feira 29, a delação teria durado quatro horas. "Estou exausto, mas aliviado", teria dito Costa a um advogado do Paraná. As falas do ex-executivo da Petrobras foram todas filmadas numa sala da Custódia da PF em Curitiba. No final de cada dia, os depoimento são lacrados, criptografados pelo Ministério Público Federal e remetidos à Procuradoria Geral da República.
Alvo da Operação Lava Jato, Paulo Roberto Costa resolveu abrir o bico porque estava desesperado com a possibilidade de ser condenado a mais de 30 anos de prisão. O estopim foi a decisão de PF de promover buscas e apreensões em empresas de suas filhas, de seus genros e de um amigo dele no Rio de Janeiro. Numa das empresas alvo da devassa, os agentes da Polícia Federal identificaram indícios fortes de que o ex-diretor da Petrobras teria mais contas abertas fora do País. Há três meses a Suíça transmitiu às autoridades brasileiras que Costa e seus parentes possuíam US$ 23 milhões em contas secretas naquele país. Essa foi uma razões que levou o juiz Sérgio Moro a decretar em 11 de junho a prisão do ex-diretor da Petrobras.
Um dos negócios mencionados por Costa envolvendo Renan Calheiros é a combinação feita com o doleiro Alberto Yousseff para que o Postalis, fundo de pensão dos Correios, comprasse R$ 50 milhões em debêntures emitidos pela agência Marsan Viagens e Turismo. Yousseff, segundo investigação da PF, era um dos investidores dessa agência. O doleiro teria encontrado Renan, em Brasília, em março deste ano, para tratar da comissão que caberia ao PMDB no negócio. A transação, porém, não teria ocorrido por causa da inesperada prisão da dupla Yousseff e Paulo Roberto Costa. Mas o esquema estava armado. O fundo de pensão Postalis é controlado por PMDB e PT desde o início do governo petista. Um notório apadrionhado de Renan, o presidente da Transpetro, Sérgio Machado também mantinha estreita relação com Paulo Roberto Costa, segundo as investigações da PF. O nome de Machado aparecia por quatro vezes em anotações na agenda do ex-executivo da estatal.
Próximo ao número de celular do presidente da Transpetro, aparecia uma menção a "curso c/Sérgio Machado, 5%", ao lado do valor RS 5 mil e da inscrição “dois meses”.
Reportagem de ISTOÉ havia antecipado em abril deste ano que o esquema de Yousseff e Paulo Roberto Costa operava nos Correios. O elo entre o doleiro e a estatal seria a JN Rent a Car, cujo nome de fantasia é Renacar. Esta empresa de aluguel de carros, sediada em Londrina (PR), e pouco conhecida no mercado, embolsou, em oito anos, mais de R$ 77,5 milhões em contratos com os Correios. No inquérito da PF, a JN aparece fazendo transações financeiras com a MO Consultoria, do doleiro Youssef. De 2005 até 2013, a locadora de veículos multiplicou seus ganhos nos Correios em até 20 vezes, com a ampliação e renovação automática de contratos que receberam nada menos que dez aditivos. O proprietário da JN Rent a Car é uma figura conhecida do meio político e policial: trata-se de Assad Jannani, irmão e um dos testas de ferro do ex-deputado José Janene (PP), réu do mensalão que morreu em 2010 de enfarte e que era um dos parlamentares mais próximos de Youssef. Agora, um novo elo com a estatal é confirmado, desta vez por intermédio de Renan.
Paulo Roberto Costa entrou na Petrobras em 2003 pelas mãos do ex-presidente Lula. Paulinho, como era conhecido, era considerado uma das pessoas mais próximas do ex-presidente da estatal José Sérgio Gabrielli. Delação premiada ou colaboração com a Justiça é a figura jurídica que prevê a redução de pena quando um réu fornece informações que possam esclarecer os crimes. O acordo de Paulo Roberto Costa com a PF prevê que ele seja colocado em liberdade tão logo encerre os depoimentos. O trato precisa ser chancelado pelo Supremo Tribunal de Federal, em processo que tem como relator o ministro Teori Zavaski. Confirmado o acerto, depois de solto, ele ficará um ano, em sua casa, no Rio de Janeiro, usando uma tornozeleira eletrônica, sem pode sair para a rua. Até duas semanas atrás, o executivo reclamava que estava sendo submetido a regime disciplinar muito rigoroso nas dependência da PF em Curitiba. Depois que começou a fazer suas revelações, o tratamento ficou mais brando.
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